domingo, 7 de dezembro de 2008

Povoando Desertos

E afastou-se
Sem mais nem porquê, sem perguntas ou respostas
Simplesmente afastou-se
Se escondeu
Sem dar chance para o acaso, flertando com o fracasso

E viveu
Como poucos poderiam imaginar, como uma ilusão
Inconscientemente viveu
Se martirizando
Mas seguindo em frente, adequando-se a corrente

E escreveu
Livros que ninguém quis, livros sem pretensões
Solenemente escreveu
Se enfrentando
Derrotando monstros febris, matando criaturas vis

E um belo dia morreu
Sem que o mundo soubesse, sem ninguém sentir
Aparentemente morreu
Se eternizando
Entrando nos corações abertos, povoando desertos

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

"Preceitos básicos e avisos adicionais a jovens escroques" - Jim Dodge

Não tente roubar uma vaca maior que sua caçamba.
Não mostre seu rabo pra Polícia Rodoviária.
Negociatas longas com grana curta é prejuízo na certa.
Não confunda o Evangelho com a Igreja.
Nunca dedure familiares ou amigos.
Evite morar em qualquer lugar onde não dê pra mijar da porta da frente.
Só porque é simples não significa que é fácil.
Não deixe seu olho grande preencher cheques que sua barriga vazia não possa bancar.
Se você não a quer, não a provoque.
Não estacione entre dois cachorrões jogando sujo.
Qualquer um amassa tomates; o foda é fazer o molho.
Nunca se é pobre demais para deixar de prestar atenção.
Não remoa por aí suas paranóias.
Nunca durma com uma mulher que considere isso um favor.
Se for atingido por um valentão, dê-lhe a outra face. Se rolar de novo, atire no filho da puta.
Manter é sempre duas vezes mais difícil do que conseguir.
Nunca atravesse uma cidade pequena a 120 por hora com a filhota do xerife nua na garupa.
Nunca registre o preto no branco.
Se você não está confuso então não tá entendendo nada.
Amar é sempre mais difícil do que parece.
P.S:
O escritor americano Jim Dodge é muito, mas muito foda. :)

sábado, 19 de julho de 2008

A Sociedade dos Robôs Sem Nome

Noite fria. Coisa rara. Dentro do ônibus dá para ver a cidade enquanto ela pensa em dormir, afinal de contas é segunda feira, são mais de onze horas da noite, ela já deve estar para dormir. Mesmo que se saiba que não de maneira completa, pois em uma cidade como essa, há pessoas para toda a sorte, para todo sofrimento, como também para todo tipo de alívio, seja este substancial, ilegal ou profissional.
Enquanto desce na parada em que ainda deverá seguir mais umas três quadras de ruas sujas e empoeiradas, a cabeça voa enquanto passa na frente da casa de Margareth, a doce e cruel Margareth que tanto lhe deu carinho mas lhe abandonou por um carinha velho e gordo para poder morar na Zona Sul. Ela lhe disse: “Vou ter vida de rica, de madame, nada desta merda aqui. To subindo de vida e isso importa mais do que tudo.”
Mesmo sem ter estudado muito ele não entendia a parte do “desta merda” já que tanto ela lhe falava quando estavam juntos e também não entendia como ir embora com um cara velho e gordo era subir na vida. Vai ver as mulheres não prestam mesmo, pensava ele, enquanto abria o primeiro dos seis cadeados que guardavam sua casa de quarto e sala, sem tratamento de água e esgoto e com a rua da frente sem asfalto, só com a poeira subindo.
Antes de se jogar na cama depois de mais um dia, ainda parou para ler uma revista dos X-Men, a única que acompanhava, apesar de ter desejo de comprar muitas mais. Os gostos de infância precisavam ser deixados de lado pela sobrevivência. Enquanto dormia, Margareth passou pelo seus sonhos, lhe causando ainda uma ereção depois de tanto tempo e depois o sono foi pesado, sem direito a mais nada.
O despertador toca. Cinco e meia da manhã. Hora de levantar e tomar rumo para o trabalho. Enquanto atravessa a cidade no primeiro dos dois ônibus que precisa pegar, o celular, comprado a muito custo em 12 vezes, toca uma música antiga, de uma banda antiga que ele gosta muito. A música é “Faroeste Caboclo” do Legião Urbana e causa uma pequena viagem na sua cabeça, enquanto ele sonha com outra vida, outro trabalho, outra força.
Dia chuvoso. Coisa normal. Durante a corrida do dia a dia para carregar as malas dos hóspedes do hotel de luxo em que trabalha na orla da cidade, ele nada mais pensa, apenas funciona como uma máquina, um pequeno robô sem nome, sem identidade a correr atrás de migalhas vestidas de gorjetas, que tem prazo de validade e normas para seguir. Ao seguir sua vida, ele passa por tantos iguais, que como ele, funcionam para guiar uma máquina maior chamada sociedade, sem que eles percebam ou mesmo reclamem. Afinal, para o mundo eles apenas funcionam.

domingo, 29 de junho de 2008

All Star

Descubra um lugar, uma nova forma de viver, um outro além
Saque as armas e corra atrás
Apenas me diga, porque não?
Faça as malas, arrume os sapatos, arranje uma parceira
Bote tudo para fora do lugar
Afinal de contas, de que vale tanta organização?
Jogue fora os livros, absorva os pecados, insista no errado
Vire as costas para quem nunca te viu
Para que andar sem ter vontade de chegar?
Empenhe os relógios, empreste um dinheiro, pinte o cabelo
Venda a sua coleção dos Beatles
Para que músicas quando não podemos ouvi-las?
Encare a vida, feche as feridas, compre um all star
Ande feito um psicótico pelas ruas
De que vale a sanidade em um mundo de loucos?
Invente velhas regras, assuste os amigos, tente se permitir
Mergulhe de cabeça para algum novo lugar
Apenas me diga, porque não?

domingo, 18 de maio de 2008

Eu Não Sou O Amor

Quando era criança me disseram para ler muito.
Que fazia bem.
Então eu li.
E quem eu li me contava que era para acreditar no amor.
E acreditei.
Fielmente acreditei durante alguns pares de anos.
Mas parei.
Sem mais nem porquê diria você.
Mas você não sou eu.
Eu não sou você.
E principalmente eu não sou o amor.
Amor que já não acredito.
E já não me preocupo com isso.
Deixa ser.

domingo, 20 de abril de 2008

Letícia

Chegará para mudar tua vida
Sem pedir passagem
Sem mudar a roupagem
E fará o ciclo recomeçar
Tudo será novo
Ainda que não seja mais
Virá como um sonho realizado
Embrulhada em papel dourado
Assim será

Será um divisor na tua história
Com doçura no olhar
Com coragem para lutar
E indicará um outro caminho
Nada será como antes
Ainda que tudo seja igual
Iluminará ao ficar aprendendo
Ensinando ao estar crescendo
Assim fará

Fará do mundo um brilho a mais
Um lugar mais belo
Um lugar menos infesto
E apresentará novas virtudes
Viver será outra alegria
Ainda que tudo continue normal
Andará espalhando cor
Recebendo e passando amor
Assim chamará: Letícia

Obs: Poeminha feito para a filha de dois grandes amigos, Glayne e Allyson. Cada dia que passa a Letícia fica mais linda. :)

terça-feira, 18 de março de 2008

Mantra

“Calma. Isso vai passar. Você sabe que vai, sempre passa.” Da mesa ao fundo bar dava para ver a noite caindo sem pressa, sem a menor preocupação. Dava para ver os carros começando a se engarrafar uns quarteirões à frente na fatídica hora do rush. Dava para ver o rosto refletido no espelho ao lado, um rosto combalido apesar dos vinte e poucos anos. E enquanto Camila passava a mão na sua mão e trocava palavras de esperança, Cláudio já não acreditava em nenhuma delas.
Havia sido assim nos últimos seis ou sete anos mais ou menos, desde que os dois amigos de infância saíram da pequena cidade do interior em busca da sorte e de uma boa universidade na capital do estado. Aquele pequeno bar perto de onde moravam (hoje, já não mais juntos, mas ainda assim próximos), serviu de palco para inúmeros porres, desesperos e comemorações além de homéricas sessões de terapia. Quase que sempre de Camila para Cláudio.
Cláudio era o típico cara que onde passava fazia amizades, as pessoas realmente gostavam de estar com ele, mas ele nem sempre gostava de estar com as pessoas, apesar de amá-las quase que incondicionalmente, preferia por muitas vezes ficar só. Por isso escolheu fazer Letras e Publicidade. Queria ser escritor. Sentia prazer em ser outra pessoa apenas ficando sozinho. E hoje trabalhando na redação de um jornal e escrevendo sobre cinema para uma pequena revista encaminhava bem seus sonhos.
Mas Cláudio sempre teve um sério problema. Sempre escolheu a pessoa errada para se apaixonar. E como ele se apaixonava. Em qualquer esquina, em um show chinfrim, na sala de aula. E quase sempre o relacionamento que ele sonhava, terminava. E lá ia chorar suas tristezas no ombro de Camila, sua fiel amiga e confidente ao qual já amparara algumas vezes também, apesar de nos últimos anos isso ser mais raro, pois ela estava noiva de um grande amigo seu.
Camila sempre lhe dizia que ele era uma mistura de Dom Quixote e Don Juan, um Don Juan às avessas, que conquistava demais, mas sofria muito por suas percas. Hoje enquanto Camila passa a mão dela no seu cabelo dizendo que tudo vai passar, que mais uma desilusão amorosa vai embora, Cláudio lembra dessa comparação e começa a rir, dizendo que talvez seja isso, talvez tenha nascido na época errada, na época em que o amor é tão subjugado e cheio de regras ao mesmo tempo em que tudo soa tão livre.
Depois de umas duas horas, pagam a conta e vão caminhando para a rua em que habitam em dois prédios bacanas de classe média e que bancam hoje já sem a ajuda dos pais. Camila fala para ele ligar se precisar de mais alguma coisa e repete que tudo vai passar, sempre passa. Cláudio dá um abraço longo finalizado com um beijo na testa e agradece, dizendo que ele não seria nada sem ela. Ela se vira e enquanto caminha, Cláudio entra no seu prédio sem antes virar mais umas três vezes, para desistir em um lamento.
Vai passar, sempre passa, repete como um mantra enquanto entra no quarto, liga o som e bota um disco do Lou Reed para tocar.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Sem Surpresas

Dia ruim. Bastante cansado, voltando pra casa no ônibus lotado por volta das 19:00hs, cede seu lugar para uma senhora e prossegue os próximos 40 minutos em pé até o seu destino. Ao descer no meio da chuva que desaba regularmente nessa época do ano, um carro passa e joga toda a lama do mundo na sua direção. Encharcado, lembra dos versos “it´s been a bad day...”, uma canção do R.E.M.
Quando entra no seu apartamento, acende a luz e se depara com as contas embaixo da porta. Condomínio, luz, telefone, cartão de crédito. Nem sequer abre, melhor deixar para amanhã. Abre a geladeira, tira uma cerveja em lata que não está muito gelada e vira em dois goles brutos, antes de caminhar para um banho que tem que melhorar seu humor, pois ainda tem muito trabalho pra tocar.
Esquenta alguma coisa no microondas, toma outra cerveja, esta mais tranquilamente e caminha para o computador. Pelo menos já está melhor e ainda são 21:00hs, o que lhe gera algo em torno de três horas antes de desabar para continuar tudo novamente no dia seguinte. Escolher a música que vai tocar é algo importante nesse momento, coloca um pequeno clássico pessoal pra rodar, “It´s A Shame About Ray” do Lemonheads. O humor melhora um pouco.
Ao abrir depara-se com três emails “para ontem” do seu chefe, o que com certeza só lhe fará dormir após as duas, três da manhã. Vida que segue, vai de encontro aos números. Enquanto as contas não fecham e os resumos dos relatórios não vem rapidamente, lembra que nunca mais atualizou seu blog, aquele pequeno espaço onde joga fora várias idéias inúteis nutridas em horas e mais horas escutando música, desde a adolescência, desde os seus sonhos de rockstar. Não vai ser hoje.
Depois de um bom tempo, com a cabeça estourando, já tendo tomado dois comprimidos de Alivium e já rodando uma coletânea do Vaselines, para espertar um pouco, decide entrar no Orkut. Ao abrir seus recados, entre vírus e promessas de pornografia gratuita, tem uma frase singela “Estou com saudade de você. :) Me liga assim que der. Bjos.” O coração bate um pouco mais forte e chega até a estranhar a mensagem. Fazia mais de dois meses sem noticias dela.
Manda um recado respondendo e pouco depois recebe uma chamada pelo msn: “Vamos conversar por aqui? Minha raiva já passou e estou te desbloqueando.” Quando menos percebe o dia parece que finalmente ia valer alguma coisa, aquele dia que havia sido tão ruim ia se transformar em algo belo, como um pequeno conto de fadas, como aquelas fabulas em que a mensagem seria mais ou menos algo como: “não fique triste, pois algo de bom sempre pode acontecer.”
No entanto quando a conversa segue, uma nova briga aparece com as mesmas cobranças antigas e aquele sabor de “acabou” no ar. Talvez ainda seja cedo demais para curar as feridas ou talvez não haja segundas chances ou redenção, quem sabe? Sai do msn, antes que escreva algumas frases que deixarão novas feridas e serão rebatidas em igual moeda. Desliga o computador, abre mais uma cerveja e se joga na cama para dormir. Amanhã é outro dia e a vida deve seguir em frente, mesmo que seja sem maiores alarmes ou grandes surpresas.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Madrugada

Madrugada. Uma calçada suja e uma garrafa quase vazia de Dom Bosco na mão. Os ônibus começam a transitar e finalmente o idiota que estava colocando Chiclete com Banana bem alto no seu carro e dançando com dois outros imbecis foi embora.
Ele olha para ela e pergunta:
- Então, me diz o que fazer?
- Fazer o quê já?
- Com a gente né?
- Não existe a gente, já te falei, no máximo existe eu perto de ti algumas vezes, mas nunca a gente, saca?
- Faz tempo que eu ouço essa historia, sempre a mesma coisa
- E ainda não aprendeste?
- Pô, Ana, qual é? Todo final de semana é essa merda, saímos, enchemos a cara e acabamos na calçada antes de ir para casa do outro
- E tu acha ruim? Eu acho lindo...
- Ora, vai te pra porra, o que eu quero dizer e isso não tem nada a ver com o fato desse vinho escroto estar quente, é que ta na hora de crescer, sei lá meu, levar isso a sério mesmo
- Olha só, não era o senhor que não queria nada antes
- Lá vem...
- Vem mesmo e com força, vai te pra porra tu, sempre com esse teu papo liberal, maior canalha tu es, vive só para viver que nem quando tinha uns dez anos a menos
- Olha...
- To olhando e ai, quer que eu te beije também?
- Quero!
Tarde. 13:30hs, enquanto ele disca o número da comida chinesa, ela se espreguiça na cama, fazendo força para levantar enquanto ele admira de mansinho seu corpo e aquele rosto que tanto lhe faz bem.
Ela percebe, vira, olha para ele e diz: “Apaga essa luz ai merda, pô!”E ele acha que está fudido dessa vez. E pra valer.
Obs: Texto antigo para caramba, tava todo mofado :)
Obs3: Uma música para o post? "All you need is love" dos Beatles.