domingo, 29 de janeiro de 2006

De Nada

“De nada” respondi depois de algum tempo, enquanto a dose de campari descia mais amarga do que nunca, como um anti bálsamo que em vez de curar, feria. Estava sem ação, atônito, confuso como nenhum outro ser já estivera antes. Não fazia nem 30 minutos que abrira meu coração para aquela mulher na minha frente, a qual já convivia há anos e agora depois de tanto tempo chamara para algo mais sério, quando do nada ela simplesmente disse que não sabia mais o que sentia por mim e que era melhor esquecer nossa vida juntos, a vida que nem chegamos a construir.
Depois de tudo ainda teve o desplante de me dizer “Obrigado por tudo que você fez por mim, com você aprendi a ser mulher e hoje com certeza sou uma pessoa muito melhor graças a você, obrigado mesmo.” E eu idiota que sou, em vez de fazer um escândalo, quebrar uma garrafa no chão, chamar a atenção de todos no restaurante, invocar todos os palavrões que conheço para a direção dela, simplesmente baixei a cabeça e disse “De nada”, enquanto ela me dava um beijo na testa, ia embora e dizia que podíamos ser bons amigos.
Quando me refiz do choque, consegui raciocinar olhando para a conta de dois pratos caríssimos que nem chegamos a provar e para o anel que trazia nas minhas mãos, parcelado de quatro vezes e com o qual daria um passo enorme abolindo minha solteirice e vida desgrenhada para ser um dono de casa, um senhor do lar, constituindo família e fazendo todas as coisas que uma família faz. Bons amigos...bons amigos o escambau!, como ela pode ser tão fria, o que eu fizera de errado?
E agora enquanto ando a esmo olhando para o mar só consigo pensar nisso, sem saber ao certo o que fazer, de nada valeu tudo que fiz esse tempo todo. É....”De nada”...

A Carta

Essa é a carta de amor que nunca te escrevi.
A carta que nunca te mandei.
Se fosse escrever essa carta algum dia, talvez começasse de qualquer jeito.
Talvez contasse uma história antes, fizesse analogismos, coisas assim.
Só é certo que usaria diversas metáforas pra esconder meu tosco amor.
Nesta carta não teria declarações de amor descabidas, sentimentais.
Não diria nunca "não vivo sem você", "sem você eu morro".
Sabemos que vivemos muito bem sem estarmos lado a lado.
Diria até que conseguimos levar melhor a vida sozinhos.
Mas essa carta não teria porquê em dizer isso, afinal seria uma carta de amor.
Nela colocaria apenas que sinto falta, bastante falta.
Falta dos momentos bons, mas também dos momentos ruins.
Falta dos teus defeitos, tuas frases feitas, teu jeito perfeito.
Falta das tuas besteiras, e até mesmo das tuas dúvidas.
Falta simplesmente de estar do teu lado.
Diria acho também, que sinto falta das tuas risadas, raras porém maravilhosas.
E falta de tudo que achava que nunca iria ter falta.
Complicado isso tudo na verdade.
Como dizer tudo agora, coisas que nunca disse.
E como esperar que tu entendas, já que nunca me entendeste.
Mas não vamos brigar, essa carta não seria pra isso.
Seria pra dizer que as vezes sou idiota, confesso, mas não percebo.
Que por mais que tentasse, sempre me escondi atrás de cenas como um filme.
Que nas coisas mais estupidas lembro de você.
Seja vendo um programa de TV, escutando uma música.
Basta uma besteira para que as lembranças passem em minha mente.
Mas isso acho que não te diria, te deixaria muito bossal.
Não espere dessa carta mentiras, ilusões, eloquência.
Espere somente sinceridade, é o que posso te dar.
Sei que não somos perfeitos, mas afinal quem é?
E talvez seja isso a grande graça, o grande motivo estarmos juntos.
Mas não posso me alongar demais com meus devaneios.
Nessa carta diria simples e fácil assim: Gosto de você!
Não como gosto das outras pessoas.
Gosto de você de um jeito especial.
Pronto, é isso.
Para a sua satisfação falei.
E caso ache essa carta de amor rí­dicula e absurda.
Podes ter certeza disso.
Como diria o poeta, todas as cartas de amor são.
Mas isso não a deixa menos importante.
Se um dia eu te mandasse.

terça-feira, 24 de janeiro de 2006

Pequim

E me chamaram de solidão
Sem nem ao menos me conhecer
Me impuseram mil perdões
Não pude nem sequer saber
E me apostaram como mortoS
em mais alma, sem vontade
Um triste corpo a vagar a esmo
Implorando uma palavra de piedade
Mas não era bem assim eu diria
Quando mais perdido, eu sorria
Apostava em novas percepções
Corria firme ao lado dos dragões
E tudo se iniciava de novo assim
Notas de uma música em Pequim
Morrerei um dia podem esperar
Mas não antes do meu sorriso fechar

terça-feira, 17 de janeiro de 2006

Quando a morte chegar...

No dia que a morte bater na minha porta para realizar a razão da sua existência, tirando minha alma daqui e colocando-a em algum lugar que não sei ao certo, quero poder ir com a consciência tranqüila. É certo que não estamos preparados para isso, mas eu queria estar. Enquanto a morte toma uma cerveja na sala de jantar esperando a hora chegar, bateria um papo, e quando ela me perguntasse “E aí, meu caro, agora que estás prestes para ir embora, valeu a pena estar aqui?”
Saboreando minha Brahma Premium bem gelada, queria responder que sim. Não por ter feito nada em especial, mas por ter sido justo, sincero e honesto durante grande parte da minha existência, sendo um cara médio, que viveu sua vida de forma tranqüila, mas com a cabeça limpa por nunca ter sacaneado com ninguém, não ter arrumado sua vida tirando proveito dos outros, bancando o esperto a toda hora, sendo um exemplo de mau-carater e sucesso, abonado por toda a hipocrisia da nossa sociedade.
Evidente que teria muitas falhas, decepções e frustrações acumuladas, e quando a morte me perguntasse “Terias feito diferente?”, responderia que sim, afinal quem não quer uma segunda, terceira ou quarta chance, ainda mais para um cara perfeccionista como eu. “Mas não vivi de forma triste”, continuaria a contar para ela, “pelo contrário, tive uma vida bastante para cima. Me diverti um bocado, aproveitei muito, mas tem sempre algo que deixamos de fazer”.
Quando tudo estivesse mais ou menos pronto para a partida, abriria outra cerveja e faria um brinde, não pela vida, muito menos pela morte, mas pela paz, por viver em paz, por não deixar que a hipocrisia, falsidade, mentiras e traições sejam partes constantes da nossa personalidade, que sigamos sempre acreditando que sermos justos e sinceros ainda vale a pena, que não abraçamos mais tanta gente mesquinha que vive ao nosso redor, nos envolvendo com sua pobreza de espirito e sua falta de ideais.
E que principalmente consigamos perceber que esse negócio de esperar demais da gente e das pessoas é o que faz a vida ser um pouco menos divertida. Até a próxima gelada, seja ela onde for.

sábado, 14 de janeiro de 2006

Um Novo Lugar

Obs: Versos datados de 15/01/1997
Um dia eu vi castelos surgir, tristezas voando pelo ar
Vi a beleza, vi a esperança de um povo, um novo lugar
Um dia sonhei viver em paz com respeito aos meus ideais
Vi a verdade, felicidade andando na luz do luar
Um dia ouvi palavras de amor da boca de um trovador
Vi a vontade, a novidade, sem raças, sem credos, sem cor
Um dia saí sem mais temer de para casa não mais voltar
Vi as pessoas alegres, cantantes ,sentadas a beira do mar
Um dia acordei, parei e olhei
E vi que não era bem assim
Vi a miséria, vi a ganância
Lamentei não estar mais a sonhar

segunda-feira, 2 de janeiro de 2006

Meio Morto

Um “procura-se” colocado na minha porta
Estampado de cores surreais, distintas
Fantasiado com molduras de ouro puro
Resultando em nada mais do que o normal
“Por favor use o cinto”, controle-se
Não deixe seus sonhos dominarem você
Óculos disfarçam aquilo que não vejo
Como dores, amores e magoas sem fim
No meio de tudo, desnudo como o começo
Participando de uma corrida maluca
Com esforços, sem coragem, sem vida
Colocando o mal ao lado do meu bem
Espere por fevereiro, dirá a velha anciã
Jogando suas cartas no meio da praça
Enquanto assumo falsas identidades
Morto, meio morto, fugaz, eternamente