sexta-feira, 26 de março de 2010

Preto e Branco

Dizer o que acontece. Eis um grande problema, pois não aconteceu nada. Simplesmente viver às vezes perde o sentido por alguns dias, algumas horas, alguns segundos. Tudo fica chato e sem graça, o tesão some completamente da vista. Só uma cama e o mergulho constante na TV, que como se fosse um analgésico ruim, acalma a dor inexistente, para depois incitá-la ainda mais forte.
Nesse ponto é que se olha para trás, o que nunca é bom e nada acrescenta na verdade, mas mesmo assim olhamos. E o que ficou para trás? Ah...ficou tanta coisa. Ficaram sonhos de conquistar o mundo inteiro. Ficaram as maiores paixões, hoje com imagens nubladas que não consegue nem distinguir se realmente viveu aquilo. Ficaram amigos, família. Ficaram sentimentos caídos ao léu.
E quanto mais tempo passa, menos as lembranças fazem sentido. A maioria delas parece que simplesmente foram inventadas, pois o eu de agora, duvida do eu que poderia ter feito isso. Como ele existiu? Como pôde? E as pessoas que existiam com ele, não podem ser as mesmas de hoje em dia. Os discos ainda são os mesmos, os filmes sempre são revistos, só as roupas mudaram de tom.
E enquanto esse nada acontece, o telefone toca, urge, grita e vangloria mensagens para mais dias vazios. O trabalho foge do prazer e vira uma obrigação e os prazeres, estes coitados, sinceramente também já não fazem sentido. O mundo gira para todo lado, a conta fica no vermelho, mais um cabelo fica branco, outro esforço de alegria some sem dizer nada. Pouco alarde para quase nada.
É nessa toada que Rui levanta em mais uma quinta-feira às seis da manhã, para entrar devagarzinho na vida que antes pulava de cabeça sem medo algum. Ele sabe que isso é passageiro, que daqui a pouco as coisas entram no rumo de novo, porém a cada nova queda dessa um pedaço maior fica para trás e ele teme que daqui a pouco os pedaços restantes já não sejam suficientes para andar em paz.

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