sexta-feira, 26 de agosto de 2005

O Tempo Não Passa

Quem vem de familia catolica com certeza deve se lembrar daquele calendario anual que vinha com uma imagem santa e várias folhinhas, uma para cada dia contendo atrás informações diversas. Pode ate soar que isso foi há muito tempo, mas lá em casa continua do mesmo jeito até os nossos dias de hoje.
Como passo a semana quase toda fora de casa (ainda chamo assim, apesar de passar pouco tempo por lá), as folhinhas dos dias só são retiradas aos fins de semana quando retorno e me lembro, sendo que um dia desses do nada parei para pensar que ao contrário do que muitos dizem, o tempo (este quase ser humano) não passa. Pelo menos lá em casa.
De súbito comecei a imaginar como a vida pode ser tão normal, tão tranqüila, seguindo seu rumo devagar, sossegada, sem pressa de acontecer. Meu pai de um lado na sua rotina entre alguns sonos diários, pequenas birras com minha mãe, jogos de futebol, reclamações sobre seus times e rememorando o passado. Minha mãe entre seus afazeres domésticos, suas rezas, missas, e claro agüentando as birras de meu velho, entre uma novela e uma conversa.
Das preocupações que lhe restaram, ficam a saúde dos filhos, o crescimento do netinho adorado, a eterna preocupação em nos ver bem alimentados (como se ainda tivéssemos oito anos) e a sua própria saúde, nada além disso, consumindo a passos lentos os segundos e minutos do dia. Nada parecido com a vida que levamos, nós, pessoas antenadas e pós modernas do século XXI.
É certo que os tempos são outros e com certeza não nos acostumamos em nossa maioria a ser assim. Estamos ocupados demais com a informação, com o nosso trabalho, nossas contas, nossos amores e desamores, além de tudo mais que acharmos necessário. Agendamos tudo. Do trabalho a diversão. Da reunião de resultados ao filme novo do Tarantino. Da ida ao banco até o encontro do fim do dia. Da leitura matinal do jornal ao chopp do fim de tarde. O tempo é o nosso eterno vilão, são tantas coisas para fazer e viver em tão poucas e disputadas horas. Ao contrário lá de casa, lá o tempo é apenas um companheiro.
Da minha vida nômade, pulando de galho em galho, de cidade em cidade, de rua em rua, de bar em bar, curtindo mil músicas ao mesmo tempo, vivendo com arremedos de paixões pelos cantos, não consigo me imaginar com essa conivência com o tempo. Para mim o tempo sempre foi algo a ser superado, algo a ser consumido, comprei até um relógio para me controlar melhor, imaginem!! apesar de ser relaxado do jeito que sou, o tempo sempre preocupa.
E ainda envolto aos meus parcos e inertes pensamentos, retirando mais alguns dias da folhinha, olho pro lado e tento perceber se nada mudou nesses dias, se algo está diferente, quando escuto uma voz suave, terna, vindo lá da cozinha dizendo: “-Drico, queres que eu esquente tua janta?”, respondo que sim a minha mãe e finalizo minhas idéias sabendo que lá em casa realmente o tempo não passa, continua no seu mais puro e belo andamento, sem pressa, na paz. Ainda bem.

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